Lajedo do Marinho…Lá, as pedras não rolam, elas falam!

31 ago 2015

Por Alessandra Lontra

Desta vez, a 5ª etapa do Adventure Tour PB aconteceu na cidade de Boqueirão, Cariri paraibano.

Bora Ali, vivenciar a emoção de conhecer a história das “Crocheteiras do Lajedo do Marinho” e de acampar sobre um lajedo de bilhões de anos?!

Boqueirão, microrregião dos cariris velhos, fica a 175 km da capital, João Pessoa. O Lajedo do Marinho é um Distrito de Boqueirão que fica a 6 Km do Centro da cidade.

Eu já tinha visitado Boqueirão há muitos anos mas, na época, nem se ouvia falar nas “Crocheteiras do Lajedo do Marinho” e nem no tal Lajedo do Marinho, e muito menos na possibilidade de se acampar por lá.

Quem me conhece, sabe que gosto de fazer trilhas e costumo desbravar o interior da Paraíba em busca de novas paisagens e aventuras. A primeira vez que ouvi falar do “Marinho”, foi por meio de uma amiga, Lourdinha Plácido Silva Matheus, que é lá do Marinho e sempre me dizia: “Ah, você não viu nada ainda. Um dia quero levar você para conhecer o Marinho.”

Depois disso, no ano passado, a consultora do SEBRAE e minha amiga, Mirian Rocha falou-me sobre as “Crocheteiras do Marinho”. Disse que eu precisava conhecer o trabalho delas.

Em outubro de 2014, o SEBRAE PB realizou um FanPress para o Lajedo do Marinho e, no dia, eu tinha outro compromisso, já anteriormente assumido, e não pude ir. Depois, vi as fotos publicadas pelos amigos jornalistas que tinham estado lá, e aquilo aguçou ainda mais a minha curiosidade sobre o local.

Imaginem a minha felicidade ao saber que uma das etapas do Adventure Tour PB era justamente para Boqueirão! E que uma das atividades que iríamos vivenciar era justamente conhecer as “Crocheteiras do Lajedo do Marinho” e, além do mais, acampar no Lajedo do Marinho!

Fiquei tão ansiosa para vivenciar essa etapa do Adventure Tour PB, que nem pensei duas vezes em aceitar o convite da Gestora de Turismo do SEBRAE PB, Regina Amorim, e parti para Boqueirão! Dessa vez, eu não iria perder a oportunidade de conhecer o Lajedo do Marinho.

Chegamos ao “Marinho” no início da noite e logo fomos recepcionados na praça principal pelas famosas “Crocheteiras do Marinho”.

Banquinhos feito de toco de coqueiro revestido com capa de crochê - Foto: Ana Célia Macedo

Sentei-me num banquinho feito de toco de coqueiro revestido com uma capinha de crochê e comecei a observar aquela comunidade tão pequena (por volta de 600 habitantes, fiquei sabendo depois), mas tudo tão organizado e colorido; aquelas mulheres nos esperando na rua com um sorriso estampado no rosto e seus trabalhos pendurados nas árvores, banquinhos e muros improvisados de gravetos.

Artesanato das Crocheteiras do Lajedo do Marinho - Foto: Lourdinha Dantas

Em seguida, Carmen, uma das crocheteiras, eleita porta-voz pelas demais, começou a nos mostrar os trabalhos feitos por elas e a nos contar a história de como tudo começou.

Carmen contou que elas já faziam muitos artesanatos, mas não tinham onde vender. Segundo Carmem, os artesanatos eram todos muito parecidos, elas não sabiam combinar as cores; usavam sempre preto e branco, e nem a linha era adequada ao tipo de crochê que elas faziam.

Bolsa feita com caixa de leite e revestida de crochê - Foto: Lourdinha Dantas

Esses “enganos” só foram descobertos após a intervenção dos consultores do SEBRAE PB, Mirian Rocha e José Carlos Almeida (Carlos). Isso foi fundamental para o surgimento das “Crocheteiras do Lajedo do Marinho”.

Perguntada sobre qual a metodologia que ela usa para abordar as comunidades onde que ela trabalhava, Mirian Rocha disse-me: “Eu só fiz aflorar o talento que havia em cada uma daquelas mulheres. Contou, ainda, que, quando chega a uma localidade, não impõe nada. Simplesmente pergunta o que as pessoas sabem e o gostam de fazer. E no Lajedo do Marinho não foi diferente; o que sobressaiu foi o crochê.

Tapete de crochê - Foto: Lourdinha Dantas

Depois de identificar o crochê como o ponto forte da comunidade do Marinho, Mirian Rocha incentivou as “Crocheteiras do Lajedo do Marinho” a participarem, em novembro de 2014, do curso sobre a técnica, com o mineiro, Renato Imbroisi, famoso tecelão e designer de artesanato, trazido pela parceria do Programa de Artesanato da Paraíba e pelo SEBRAE para dar um curso para crocheteiras de João Pessoa, Campina Grande, Pilar, Conde, Cabedelo, Mari, Esperança, Mata Redonda, Areial, Santa Rita e Boqueirão.

Carmen, crocheteira do Lajedo do Marinho participando do curso do Renato Imbroisi

As “Crocheteiras do Lajedo do Marinho” ficaram maravilhadas com a consultoria do Renato Imbroisi. As novas técnicas aprendidas no curso, serviram para que elas aperfeiçoassem o que já sabiam, conhecessem a variedade de linhas e cores, e também aprendessem a combinar cores e formatos.

Segundo Renato Imbroisi confessou à consultora do SEBRAE, Mirian Rocha, o ponto de crochê das “Crocheteiras do Lajedo do Marinho” é o melhor do Brasil.

A partir dali, elas já estavam prontas para exporem no Salão de Artesanato da Paraíba, onde o tema “Das mãos florescem o crochê”, foi uma homenagem a todas as crocheteiras da Paraíba.

Participar da 21ª edição do Salão de Artesanato da Paraíba, aumentou a autoestima das “Crocheteiras do Lajedo do Marinho e deu a elas a certeza de que eram capazes e de que estavam no caminho certo. E,  é claro que o sucesso foi garantido e dera-lhes o direito de participarem de vários outros salões de artesanatos na Paraíba. Elas participaram do Salão de Artesanato em São Paulo e como fazem também peças a partir de trapilhos de malha, esses produtos foram o diferencial, em relação aos outros expositores, e foram tão bem aceitos que quase que elas não deram conta das encomendas.

21º Salão de Artesanato da Paraíba

Todo esse sucesso e reconhecimento serviu também para elas repassarem para outras mulheres e até para os rapazes do Marinho o conhecimento adquirido e, assim, perpetuarem essa técnica artesanal que, apesar de tão antiga, se não for preservada, pode se perder no tempo.

Elas iniciaram os trabalhos com 15 mulheres e, hoje, já são 20 mulheres e um rapaz envolvidos no processo. As crocheteiras estão tão empolgadas e focadas, que até  já criaram uma mensalidade e um fundo, cuja parte da venda de cada produto é aplicado nesse fundo para, num futuro muito próximo, poderem criar a sua própria associação, a “Associação das Crocheteiras do Lajedo do Marinho”.

Pizzaria Pé de Serra da empreendedora do Lajedo do Marinho, Suelen Oliveira - Foto: Fábio Cardoso

Vimos, a partir desse movimento, novos empreendedores surgindo, como foi o caso da Suelene Oliveira que inaugurou a Pizzaria Pé de Serra, que serve pizza, café da manhã, almoço e jantar regionais. A Pizzaria, além de atender ao morador local, também serve de apoio às pessoas que ficam no acampamento rural do Lajedo do Marinho. Tudo é feito com muito amor; a comida é gostosa e o ambiente decorado com muito capricho.

Se vocês pensam que as emoções acabaram, estão enganados. Ainda faltava o “Acampamento Rural do Lajedo do Marinho”.

Nadilson Vireira (Condutor de Turismo) com Regina Amorim (SEBRAE PB)e Tadeu Ferreira (Guia de Turismo)

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Imaginem um acampamento rural em cima de um lajedo de bilhões de anos e totalmente sustentável! Fomos apresentados ao Nadilson Vieira, ao Francisco Plácido e ao Aluizio Plácido. Ele fazem parte do grupo de “Condutores do Lajedo do Marinho”. O grupo é formado por pessoas da comunidade que fizeram o curso de condutor de turismo e, após a consultoria do renomado guia e consultor do SEBRAE, Tadeu Ferreira, ou simplesmente Tadeuzinho, como gosta de ser chamado, fizeram o 1ª acampamento rural do Brasil em cima de um lajedo. Tadeuzinho deu todas as coordenadas dos equipamentos necessários para fazer o camping e do banheiro ecológico; e eles seguiram tudo à risca.

Portão que dá acesso ao Camping Rural do Lajedo do Marinho

Logo no portão que divide a comunidade e o acampamento, pudemos sentir a mudança de ar. O cheiro do curral e da natureza já anunciavam que estávamos num ambiente totalmente rural e de ar puro.

Caminho para o Camping Rural do Lajedo do Marinho

Subimos por um caminho que antes fora feito para escoar a água da chuva. No início da subida, começamos a ver algumas inscrições rupestres, cajueiros, um cruzeiro, tudo muito bem cuidado.

Camping Rural no Lajedo do Marinho - Foto: Alessandra Lontra

Depois de alguns minutos de subida íngreme, deparamo-nos com um acampamento muito bem organizado, com luz, barracas com colchões, um fogão à lenha e um banheiro com fossa ecológica.

Banheiro ecológico do Lajedo do Marinho - Foto Teresa Cristina Duarte

Além dessa estrutura toda, ainda tem wi-fi, serviço de apoio com bebidas, refrigerantes e caldinhos para se comprar, evitando, assim, que tivéssemos que descer mais tarde para comer. Tudo ali à mão e feito com o maior capricho.

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E, para completar o serviço 5 estrelas, ainda teve uma seresta com voz e violão, com o cantor local, Joab Júnior e Dayane ao violão, nos encantaram.

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À noite, os condutores de apoio ficam acordados de vigília para garantir a nossa segurança.

Não resisti e, ainda à noite, subi no alto do lajedo para contemplar o céu estrelado que, mesmo sem lua, estava com uma luz fantástica. Fiquei lá de cima olhando o acampamento e o frondoso umbuzeiro que servia de apoio para pendurar a iluminação central do acampamento. Pensei comigo; “Se à noite já é lindo, avalia quando amanhecer?

Camping visto do alto do Lajedo do Marinho

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E não estava enganada. Acordei ás 5h da manhã e, quando abri a barraca, o vento frio recebeu-me e a paisagem deslumbrante saltou-me aos olhos.

Visão magnífica do nascer do sol do alto do Lajedo do Marinho - Foto: Lourdinha Dantas

Saí da barraca com a máquina fotográfica em punho, louca para fazer milhões de fotos. Fui logo para o topo do lajedo e de lá vi o sol surgindo, todo majestoso. A luz, o vermelho da terra, o cinza da vegetação da caatinga e o céu muito azul, quase sem nuvens, descortinaram um cenário de emocionar os corações mais céticos da face da Terra! Fiquei ali, parada, olhando tudo ao redor e agradecendo a Deus pela oportunidade de ver um espetáculo daqueles. Até me esqueci do meu propósito inicial…tirar fotos.

Eu brincando com minha própria sombra no Lajedo do Marinho - Foto: Alessandra Lontra

Depois fiquei ali brincando com minha própria sombra que teimava em me reproduzir, imitando-me no meio daquelas rochas enormes e colocadas ali há bilhões de anos, pela força da natureza. Como diz minha amiga e fotógrafa, Kleide Teixeira: “Só não me venham com essa história de que foram os extraterrestres que colocaram aquelas rochas lá…Pelo amor de Deus!”

Tadeu Ferreira (guia de turismo) tocando gaita para acordar os campistas

Permaneci ali, por um bom tempo contemplando tudo e, para complementar o cenário deslumbrante, Tadeuzinho ainda tocou, na gaita, a famosa música de Luiz Gonzaga, Paraíba…

Quando a lama virou pedra
E Mandacaru secou
Quando o Ribaçã de sede
Bateu asa e voou
Foi aí que eu vim me embora
Carregando a minha dor
Hoje eu mando um abraço
Pra ti pequenina
Paraíba masculina,
Muié macho, sim sinhô

Aí foi muita emoção para esse pobre coração…INESQUECÍVEL!

O que vi no Lajedo do Marinho foi um processo de desenvolvimento e observação de novos ambientes produtivos e de inovação criativa que está tendo um impacto real na qualidade de vida e no desenvolvimento cultural, social e econômico daquela região. Vi mais além! Vi que a comunidade é, na verdade, uma rede de cooperação, onde todos estão irrmanados pelo mesmo objetivo: o de não deixarem sua terra e poderem, a partir do seu próprio trabalho, serem vistos, reconhecidos e conseguirem seu próprio sustento com dignidade.

O aprendizado que tive com aquele pequeno Distrito, no Cariri paraibano, vou levar comigo pelo resto da vida.

Ana Célia Macedo, Lourdinha Dantas e Eu

Se me perguntarem se eu “conquistei” o Marinho…Digo que o Marinho foi quem me conquistou!

E você, o que está esperando para conhecer o Distrito do Marinho?

Como chegar:
De João Pessoa, pegar a BR 230 sentido Campina Grande. A partir de Campina Grande, seguir pela BR 104 com destino a Queimadas; depois, pegar a PB 148 até Boqueirão.